Minha paixão por Londres começou por acaso. Eu era agente de viagens no Brasil, estava com dinheiro guardado pra fazer um curso de rádio que acabou não saindo, e o que acabou surgindo foi a oportunidade de viajar pro exterior por um preço com desconto. Não pensei duas vezes (na verdade pensei bem mais que duas porque sou muito metódico).
O programa era simples: 10 dias em Londres, mais quatro em Paris. Me fui. Mal sabia que estava cimentando ali a fundação da minha vida de hoje. Mal sabia que dali uns meses iria chamar esta cidade de casa.
Voltei pro Brasil e depois de dois meses decidi que iria voltar de mudança. Lembra que falei que sou metódico? Pois então… Notei as áreas do inglês que precisava melhorar e comecei a estudar e praticar em casa mesmo; vendi muito naqueles meses pra receber uma comissão mais gorda e economizar o máximo de dinheiro que conseguisse; vendi tudo que tinha de livros, móveis e instrumentos musicais; comecei a estudar sobre a história do país pra onde estava me mudando, arrumei a mala e a cuia (e a erva-mate claro!) e cheguei em Londres num dia de inverno de 2014.
Na mala não tinha só roupas, cuia e erva-mate. Tinha muita vontade de aprender, de meter a cara e fazer tudo acontecer. Já tinha feito isso no Brasil, onde aprendi tudo do zero (como todo mundo, ninguém nasce sabendo), por que seria diferente aqui? Por causa da língua e das barreiras culturais é a resposta mais óbvia e que mais faz sentido. Mas ainda assim, não é dífícil passar por cima disso.
Meu blog já existia, só coloquei no ar uma página onde agora oferecia passeios guiados pela cidade. Já estudava sobre o país antes de chegar, continuava estudando, e queria mostrar a cidade pras pessoas.
Enquanto isso, um mês depois de chegar em Londres comecei a trabalhar em um restaurante. Em pleno dia dos namorados, a noite mais movimentada do ano, lá estava o brasileiro iniciante, levando pratos de um lado pro outro, muitas vezes só replicando as ações, tentando dar sentido a elas. A atividade de runner é uma espécie de auxiliar de garçom. Na maioria das vezes, mas não no primeiro dia, quando a função acaba sendo de atrapalhar mesmo.
Queria mais. Queria conversar com as pessoas, queria sentir mais prazer na minha atividade. Quando ouvi que uma vaga havia aberto no bar não hesitei (mesmo, desta vez!) em pedir pro gerente se eu poderia tentar. Colegas me julgaram, porque se eu optasse por virar garçom o salário seria bem melhor. O que é legal, mas o que eu queria mesmo era sentir mais prazer no trabalho, lembra? Outros colegas me reprovavam. A reprovação vinha na forma de piadas, afinal como iria fazer coquetéis, sendo aquele meu primeiro trabalho em bar? Como se eles tivessem nascido sabendo…
Enquanto ainda era runner eu chegava 40 minutos antes do meu horário pra poder praticar o free pouring (colocar uma quantidade específica no copo sem precisar de medidor) e no transporte estudava as especificações e medidas de cada coquetel. Me senti preparado pro teste e passei sem errar nada. Os mesmos colegas que me reprovavam agora questionavam como eu havia feito pra colar durante o teste. Outros, mais racionais, me parabenizavam e davam boas-vindas até com presentes – e bebidas, claro.
Neste meio tempo, dois meses depois da minha chegada em Londres recebi um contato da Eneida, administradora do blog Londres para Principiantes. Ela havia visto meu blog e tinha tido uma ideia que eu já estava fermentando: gostaria de fazer um passeio por pubs históricos. Por que não? Estudei, pesquisei sobre pubs e cervejas, sobre a história do caminho, como degustar, processo de fabricação e etc e fizemos o primeiro teste. Em abril de 2014 comecei o passeio que hoje executo duas vezes por semana.
Mas e o restaurante? Tudo continuava igual, somente com a diferença que consegui negociar com eles pra ter todas as terças-feiras livres para eu fazer esta atividade secundária. Aceitaram e tudo caminhou em harmonia.
As pessoas gostaram tanto do passeio que senti a necessidade de criar um novo tour. Em setembro começamos o passeio sobre os Beatles em Londres. Mais um sucesso!
Mas e o restaurante? Reduzi muito as minhas horas e trabalhava dois dias por semana, das oito das manhã as oito da noite. No restante do tempo poderia me dedicar a conseguir atrair novos clientes e a desenhar um novo passeio. Pesquisando sobre Beatles percebi que havia muita coisa de várias bandas das décadas de 60 e 70 em especial, e aí criei um roteiro focado no rock britânico. Mais um sucesso.
Mas e o restaurante? Deu pra ele. Exatamente no dia que completei um ano de Londres eu estava fazendo meu último dia de trabalho – celebração dupla depois do expediente. Agora a minha dedicação seria muito maior. Como atrair novos clientes?
Gosto muito de escrever e falar, então poderia ajudar as pessoas com informações de hábitos, história, cultura e turismo em Londres fazendo um canal no YouTube. Sempre foquei em criar conteúdo voltado pra estes quatro temas, e depois de um tempo comecei a citar os passeios que eu fazia no canal. Mais e mais pessoas começaram a acompanhar meu trabalho, confiar em mim e fazer um passeio comigo.
Com o tempo acabei criando outros roteiros: Jack o estripador, filmes em Londres, segredos de Londres, segunda guerra mundial e Harry Potter.
Sempre fiz os vídeos do canal com gosto. Pensando em coisas que gosto de falar, acima de tudo. Por isso criei também um estilo de vídeo diferente chamado Papo de Pub. Um bate-papo com três pessoas em um pub com plateia assistindo. Uma conversa leve, bem de pub, pra contar histórias e dividir experiências.
Depois de morar em Londres por três anos, conheci a guria mais incrível deste mundo. O destino colocou a Julia no meu caminho quando estava em Edimburgo e ela me chamou pra uma cerveja. Na semana seguinte bebemos em um pub em Londres, no dia seguinte numa das gravações do Papo de Pub começamos a ficar, logo depois a namorar, e pedi ela em casamento um pouco mais de um ano depois do primeiro encontro. Preparei uma viagem surpresa pra Escócia e lá rolou o pedido. Cinco meses depois estávamos casando no pub onde tudo começou, no mesmo dia do casamento real. Não poderia ter pedido uma pessoa melhor pra ter ao meu lado pro resto da minha vida. Sou grato ao universo por ter feito nossos caminhos se cruzarem da forma como foi.
Hoje a empresa está constituída, cinco dos passeios continuam rolando toda semana, e em 2019 devo tirar mais dois projetos do papel. O que quero é conforto e já tenho ele. Mas ao mesmo tempo não quero que o conforto me limite, quero sempre buscar mais e alcançar mais, ou ao menos dar o meu melhor pra isso.
Já estou na melhor cidade do mundo, já tenho a pessoa que amo ao meu lado, e faço o que gosto. Todos os sinais indicam que alguma coisa certa eu fiz.
No meu pulso tenho tatuado “ta”, que é uma forma inglesa de dizer “thank you”. Nada pode descrever melhor o que eu sinto por pessoas que apareceram no meu caminho, situações e até coisas que na hora eu julgava não serem boas.
De verdade, ta.